A Cinemateca Brasileira (CB) é a principal instituição de patrimônio audiovisual do Brasil e, em 2020, passa por sua pior crise. Como resultado, seu expressivo acervo audiovisual e documental está ameaçado, bem como seu complexo parque tecnológico e os saberes técnicos que o permeiam. No início do ano, uma enchente ocorreu em um galpão em uma de suas unidades, afetando drasticamente sobretudo parte de seu acervo de película e de equipamentos. Desde agosto de 2020, as instalações e os acervos estão sem acompanhamento técnico; e até a conclusão deste texto não há perspectiva de uma resolução imediata, condizente com a urgência. A inação e o descaso com a Cinemateca Brasileira são mais uma das perversidades do atual governo, e se soma ao desmonte estrutural do sistema público de saúde, educação e cultura,1 e ao projeto de ecocídio e genocídio da população indígena e negra; este último acelerado pela pandemia de Covid-19. A crise da Cinemateca tomou proporções inéditas em 2020, mas sua origem é anterior, perpassando a crise administrativa e política de 2013 e um incêndio no início de 2016. Este artigo tem como enfoque os trabalhos realizados na Cinemateca Brasileira a partir de meados de 2016, de grande fôlego e entusiasmo na retomada dos trabalhos; o desafio de sua continuidade com a redução da equipe em 2017; a suposta solução com um novo modelo de gestão em 2018; e a hecatombe de 2020.2 O texto também apresenta conjecturas sobre as relações entre o patrimônio audiovisual e a cadeia produtiva do audiovisual. A sucessão de crises ao longo dos 74 anos da instituição, acentuadas por quatro incêndios e a enchente, são de forma mais ampla, o que a museóloga brasiliense Fabiana Ferreira destaca em sua tese A Cinemateca Brasileira e as políticas públicas de preservação do acervo audiovisual no Brasil (2020). Ela alega que “o único aspecto estável nas políticas públicas de preservação audiovisual é sua inconstância. Uma sucessão de desencontros e desarticulações por parte dos agentes políticos responsáveis pela criação e implementação de políticas sem um real projeto de Estado que atravessa governos” (2020, p.109). Segundo Hernani Heffner, não é somente a maior crise da Cinemateca Brasileira, mas a maior crise do patrimônio audiovisual brasileiro.
Panorama das Últimas Duas Décadas
O Brasil é uma república federativa presidencialista, com 26 estados e um distrito federal, de dimensões continentais – o quinto maior país do mundo em extensão territorial. O país passou por dois processos de redemocratização, sendo o mais recente a partir de 1984, após a ditadura militar estabelecida em 1964. Neste novo século, o país contou com um crescimento econômico, teve significativa redução das desigualdades sociais e de índices de pobreza extrema, ampliação de universidades e um processo de fortalecimento da indústria do audiovisual, por meio de políticas e programas federais, com destaque para as políticas de investimento da Secretaria do Audiovisual (SAv) / Ministério da Cultura (MinC)4 e do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA)5 , o que gerou amadurecimento de profissionais, das empresas, e traduziu-se em um volume crescente de obras a cada ano. Eventuais recursos municipais e estaduais somavam-se aos federais. Laura Bezerra pondera que, enquanto o governo investia na descentralização das políticas de cultura, o mesmo não ocorria com a preservação (2015). Nesse período e a partir de sua inclusão no organograma da SAv, houve sólidos investimentos na Cinemateca Brasileira, mas foram diminutas as discussões políticas sobre a gestão do patrimônio, e acerca das ações e mecanismos necessários para que essa gestão fosse feita de forma profunda e mais ampla.6 – referência fundamental para o entendimento do tecido da crise atual. Conforme diagnosticado por Fabiana Ferreira, “a Cinemateca não atua na criação e implementação de políticas de preservação, seja realizando discussões e dialogando com o setor, seja participando ativamente dos espaços políticos no âmbito federal, como o Conselho Nacional de Cinema, por exemplo. Também não houve diálogo estruturado com outras entidades gestoras de memória” (2020, p.108). A insuficiência do Estado na gestão do patrimônio acarreta graves reverberações, que abalam a cadeia produtiva do audiovisual – esta não parece vislumbrar a preservação como elemento integrante e necessário para a própria cadeia. Ainda, a crise da Cinemateca Brasileira torna-se mais um argumento para a descentralização (e incremento) de investimentos na gestão do patrimônio audiovisual em todo país.7 O Brasil possui uma miríade de instituições de patrimônio federais, estaduais, municipais e privadas que não estão no holofote, mas que também demandam ações e recursos urgentes.
As últimas décadas foram de constante amadurecimento da área de preservação audiovisual, com a instauração de programas de financiamento específicos; o impulso de publicações; a criação e crescimento da CineOP - Mostra de Cinema de Ouro Preto, na qual ocorre o Encontro Nacional de Arquivos e Acervos Audiovisuais8 a formação da Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA) e a elaboração do Plano Nacional de Preservação Audiovisual (PNPA)9; além do crescente número de eventos.
Cinemateca Brasileira – Breve Histórico
A Cinemateca Brasileira contou com diversos arranjos administrativos, tendo começado como uma organização da sociedade civil e, posteriormente, passou para a esfera pública. Seu longo histórico abarca muitos percalços com alguns respiros. O escritor, ensaísta, crítico, pesquisador, professor e militante Paulo Emílio Sales Gomes (1916-1977) é o protagonista na criação, defesa e gestão da Cinemateca. A atuação de Paulo Emílio é mais ampla que a própria Cinemateca, é fundamental na valorização do cinema brasileiro – e em sua qualificação como documento histórico –, na defesa de sua preservação, na criação de cursos de cinema em universidades, atuante na política internacional – como membro regular do Comitê Executivo da Federação Internacional de Arquivos de Filmes (FIAF), entre 1948 e 1964, e eventualmente como vice-presidente –, além de autor referência em estudos historiográficos de cinema, com suas publicações sobre o francês Jean Vigo e sobre o brasileiro Humberto Mauro. Como professor, foi muito importante pela formação de cinéfilos, intelectuais, críticos de cinema e preservacionistas – sendo que alguns deram continuidade a seu trabalho na Cinemateca Brasileira.
Considerando a profusão de publicações sobre a Cinemateca Brasileira em português, e o limitado repertório em inglês, e tratando-se de uma plataforma bilíngue, apresento um breve apanhado, com momentos-chave sobre a história da instituição. Em 1940, por iniciativa de intelectuais paulistanos, foi criado o Clube de Cinema de São Paulo. Promovia a exibição de filmes, conferências, debates e publicações. Foi fechado pela ditadura de Getúlio Vargas em 1941. Em 1946 Paulo Emílio vai para a França estudar no Institut des Hautes Études Cinematographiques (IDHEC) e torna-se ainda mais próximo da Cinemathèque française, instituição com a qual mantinha contato, pois já havia morado em Paris na década anterior, período em que sua paixão pelo cinema despertou. Nesse ano é criado o Segundo Clube de Cinema de São Paulo, dessa vez, além de contar com as atividades anteriores, também tinha a iniciativa de prospecção e preservação de materiais de obras brasileiras. Portanto, 1946 é considerado o marco da criação da instituição. O Clube é filiado à FIAF por Paulo Emílio em 1948. No ano seguinte, é criada a Filmoteca do (recém-criado) Museu de Arte Moderna de São Paulo. Em 1956 desliga-se do museu e se converte em Cinemateca Brasileira, sociedade civil sem fins lucrativos. Neste ano é formado o Conselho Consultivo.10 Em decorrência da autocombustão de um rolo de nitrato de celulose, ocorre o primeiro incêndio no verão de 1957, que “destruiu integralmente a biblioteca, a fototeca, os arquivos gerais e a coleção de aparelhos para o futuro museu de cinema, assim como um terço do acervo de filmes” (Gomes, 1981, p. 75). A tragédia suscita o apoio e doações de entidades nacionais e estrangeiras, e a Cinemateca ganha um espaço no maior parque urbano de São Paulo, o Parque Ibirapuera. Em 1961 torna-se uma fundação sem fins lucrativos, fato importante para sua autonomia e para o levantamento de recursos públicos.
No ano seguinte, é criada a Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC), entidade civil sem fins lucrativos, para auxiliar a Cinemateca na gestão de recursos financeiros e para desenvolver atividades de apoio à Fundação. Se inicialmente as ações de difusão eram o motor da Cinemateca, a partir da década de 1970, a preservação passa a ser seu eixo, em parte pelo estado de seu acervo. O final dos anos 1960 e meados dos 1970 é um período crítico, com poucos funcionários, por vezes em trabalho voluntário. Em 1963 a Cinemateca é desligada da FIAF, devido ao não pagamento das taxas de anuidade, retomando como observadora em 1979, e como membro pleno somente em 1984. O segundo incêndio ocorre no verão de 1969, pelo mesmo motivo que o anterior, com perda significativa de materiais documentais. Em 1977 o laboratório da instituição é iniciado, a partir de equipamentos de laboratórios comerciais desativados. Paulo Emílio falece nesse mesmo ano, de ataque cardíaco.
Em 1980 é inaugurado no Parque da Conceição o Centro de Operações, para trabalhos de documentação e pesquisa. O terceiro incêndio ocorre no outono de 1982. Como decorrência, um movimento pela incorporação ao poder público culmina na extinção da Fundação Cinemateca Brasileira e na incorporação, como órgão autônomo, à Fundação Nacional Pró-Memória, do governo federal, em 1984. Em 1989 é alugado um cinema11em Pinheiros, bairro movimentado da cidade, que alavancou significativamente a cinefilia da cidade. Ao final desta década, seu quadro funcional conta com cerca de 40 pessoas, sendo 30 contratados, muitos ex-alunos de Paulo Emílio.
Em 1990 a Fundação Nacional Pró-Memória é extinta, e a Cinemateca é incorporada ao Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural (IBPC), criado naquele ano, e quatro anos depois transformado em Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Em 1997 é inaugurada sua sede definitiva12, no antigo Matadouro da Vila Mariana, em terreno cedido pela prefeitura, após nove anos de reformas – com o devido tombamento do conjunto arquitetônico. A sede definitiva agrega os departamentos e salas de exibição antes espalhados pela cidade de São Paulo, e pode ser vista como elemento-chave no processo de consolidação da instituição, após décadas de escassez de recursos, precariedade de infraestrutura, mudanças na dinâmica administrativa e institucional.
Em 2001 é inaugurado seu depósito de matrizes, inicialmente com capacidade para 100 mil rolos de filme, com controle de temperatura e umidade. No mesmo ano é iniciado o projeto Censo Cinematográfico Brasileiro13 , com financiamento da BR Distribuidora14 O projeto foi um importante marco para a identificação e tratamento do acervo da instituição15, e para a formação de mão de obra técnica. Ele “organizou-se sobre quatro eixos básicos: o levantamento e exame do acervo existente, concentrado e disperso; a duplicação de filmes amea[ça]dos de desaparecimento por seu estado de deterioração; a divulgação do trabalho e de seus resultados; o estudo de medidas legais para a proteção do patrimônio audiovisual” (Souza, 2009, p.258). Em 2003 a Cinemateca é incorporada à SAv/MinC, após deliberação do Conselho, considerando que o IPHAN não estava atendendo o escopo e não se envolvia nas estratégias da Cinemateca senão para aprovar planos de trabalho. Nos anos subsequentes, os recursos repassados pelo MinC aumentam gradualmente. Em 2003 é implementado um programa de estágio de curta duração para técnicos de outras instituições. De 2004 a 2006, o projeto Prospecção e Memória dá continuidade ao projeto do Censo, sobretudo em relação à catalografia de obras brasileiras, compiladas na base de dados Filmografia Brasileira.16
Em 2005 é criado o Sistema Brasileiro de Informações Audiovisuais (SiBIA), programa da SAv, com coordenação da CB, “programa que visa estabelecer uma rede que conta neste momento com a participação de mais de 30 instituições que se dedicam, prioritária ou subsidiariamente, à preservação de acervos de imagens em movimento em todo o Brasil”17. A instituição é escolhida como sede do 62º Congresso da FIAF em 2006, cujo tema é “O futuro dos arquivos de filmes em um mundo do cinema digital: arquivos de filmes em transição”. No mesmo ano, à ocasião do 60º aniversário da instituição, com comitiva de ministros e secretários, Luiz Inácio Lula da Silva é o primeiro (e único) presidente do Brasil a visitar a CB. Em 2006 é publicado o Manual de Manuseio de Filmes e o Manual de Catalogação da instituição, normativas internas e importantes referências para as demais instituições brasileiras, sobretudo à época, ainda com poucas publicações técnicas em português. Em 2008 a SAC torna-se uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e, a partir de então, são volumosas as transferências de recursos para projetos na Cinemateca. Na gestão da SAC, são realizados projetos da próprio SAv – como meio de garantir agilidade na execução de programas do Ministério, como a Programadora Brasil.18 A partir de 2008 são publicados relatórios anuais de atividades.19, à exceção dos seguintes anos: 2013, 2015, 2018 e 2019. Como resultado do Censo, são confeccionados materiais de preservação e difusão no laboratório da instituição, e realizadas restaurações com recursos de projetos e programas. Em 2009 é lançado o Resgate do Cinema Silencioso Brasileiro, caixa de DVDs com 27 títulos de filmes silenciosos com trilhas sonoras compostas especialmente para a edição. Em 2011 é inaugurada uma instalação secundária na Vila Leopoldina20 , para armazenamento de películas, documentos, equipamentos, dentre outros. Em 2012 é publicada a primeira edição da Revista da Cinemateca Brasileira e, no ano seguinte, sua segunda edição.21 Em 2013 é instaurada uma crise político-administrativa, com a sumária exoneração do diretor-executivo da instituição, sem o devido diálogo com o Conselho, sem as medidas adequadas para sua substituição ou um plano de transição. São realizadas sucessivas auditorias da Controladoria Geral da União em relação à execução de recursos da SAv pela SAC e à aquisição de acervos pela União.22 Ao final do ano, dos 124 funcionários ativos antes da crise, poucos permaneceram, dentre eles os 22 funcionários públicos diretamente vinculados ao ministério.23 A partir do relatório de 2014, é possível verificar que alguns (poucos) fluxos de trabalho continuaram. Destaco a interrupção de um fluxo não executado em 2014 (e 2015), que afetaria drasticamente o acervo:
No verão de 2016 ocorre o quarto incêndio, mais uma vez em decorrência da autocombustão de um rolo de nitrato. A perda foi estimada em 1003 rolos de filmes em nitrato de celulose, referentes a 731 títulos. Além da descontinuidade da revisão deste acervo com a crise de 2013, alguns anos depois foram descobertos alguns rolos recém-chegados à instituição, que foram alocados no depósito sem a devida remoção da embalagem de transporte. Isso poderia ter sido evitado se a equipe técnica tivesse sido encarregada de alocar e realocar as obras dentro dessa coleção de filmes. Esse descuido potencialmente criou condições para um microclima sujeito à autocombustão e pode ter sido o segundo fator responsável pelo incêndio. Porém, o fator primário sempre será a irresponsabilidade do poder público, ante a falta de condições para o exercício das atividades básicas da instituição.
Cinemateca Brasileira – de 2016 a 2017
O incêndio de 2016 coincide com a entrada de 11 técnicos, viabilizados por um contrato de serviços firmado entre a SAv/MinC e a Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), que entrou em vigor no final de 2015, com duração de um ano. Ao todo, até meados do ano, foram 42 técnicos contratados, que se somavam aos 15 servidores diretamente vinculados ao MinC. Foram também contratadas empresas terceirizadas de serviços essenciais (manutenção, limpeza, segurança e TI) e 7 técnicos para o fluxo de Depósito Legal24, viabilizados pela Agência Nacional do Cinema (Ancine). No relatório anual de atividades de 2016, o tom da apresentação da diretora Olga Futemma25 é de otimismo e orgulho pelo cumprimento das metas estabelecidas no Plano de Trabalho do Contrato, com a devida indicação das dificuldades e desafios criados a partir da descontinuidade dos trabalhos nos anos anteriores. Destaque para os trabalhos realizados em decorrência do incêndio:
“balanço e comunicação das perdas […]; exame, separação por grau técnico e triagem para encaminhamento de materiais [...] para processamento laboratorial; alocação provisória dos 3 mil rolos de nitrato remanescentes; elaboração de projeto de implantação, no depósito incendiado, de dispositivos contra sinistros […]; reforma básica do depósito, realizada pela equipe da Cinemateca, para o retorno da coleção […]; descarte técnico de resíduos do incêndio”.
Apesar do desastre, não foram obtidos recursos junto ao MinC para dispositivos contra sinistros.26 Outro desafio explicitado por Futemma foi a situação do Laboratório de Imagem e Som: devido à paralisação anterior, o “cenário era desolador”, dizia. Para enfatizar sua importância: trata-se de um dos mais completos (e último?) laboratórios de processamento audiovisual fotoquímico da América do Sul, com possibilidade de processamento de película para película (35mm e 16mm, suporte p&b de todos os materiais e confecção de cópias de materiais cor); de película 8mm, 9,5mm, 16mm e 35mm para digital (HD, 2K, 4K, 6K); back-to-film, de digital para película 35mm; captura de diversos formatos em vídeo (U-Matic, Betacam SP, Betacam digital, DVCam, entre outros) para digital; manipulação digital de imagem e som, incluindo correção de cor e restauração. O maquinário foi trabalhado ao longo dos anos para processar materiais com deterioração avançada.27 Devido à ausência de equipe nos anos anteriores e à decorrente falta de manutenção e peças, não foi possível retomar alguns fluxos.
O acervo audiovisual contém cerca de 250 mil rolos, entre películas com suporte de nitrato, acetato de celulose e poliéster, além do expressivo acervo de fitas e rolos magnéticos, e aproximadamente 800 terabytes de arquivos digitais, sobretudo de materiais digitalizados do acervo e materiais encaminhados para Depósito Legal. O acervo documental abarca cerca de um milhão de documentos relativos ao audiovisual, como cartazes, fotografias, desenhos, livros, roteiros, periódicos, certificados de censura, material de imprensa, documentos de arquivos pessoais e institucionais.28 Ademais, há uma coleção de equipamentos, não catalogada, de tecnologias do audiovisual de diversas décadas. No período recente, a instituição dividia-se nos setores: preservação de filmes, centro de documentação e pesquisa, difusão – programação.29 e eventos, atendimento, administração, manutenção e tecnologia da informação.
No setor de Preservação de Filmes, diversos fluxos foram executados ao longo de 2016: acompanhamento da climatização dos depósitos, movimentação de materiais de acordo com suas características físicas ou deterioração, revisão da documentação, atendimento a solicitantes e duplicação emergencial de materiais, que será comentada adiante. Um fluxo de trabalho importante foi a documentação, de forma coletiva, de ações necessárias, mas para as quais não havia recursos suficientes. Depois de meses de manutenções corretivas e avaliação dos químicos e de película virgem no estoque, foi iniciado o processamento de materiais em avançado estágio de deterioração considerados únicos: “a seleção foi feita considerando as condições técnicas dos materiais, [com investimento de] menos tempo e recursos nas ações complementares de uma só obra para que seja possível viabilizar ações, embora incompletas, em um número mais amplo de materiais”, de acordo com o Relatório de 2016.30
Devido às metas estabelecidas no Plano de Trabalho e aos exíguos tempo e equipe disponíveis em 2016, a seleção de materiais para processamento em laboratório foi realizada por apenas um técnico, sem debates e discussões mais amplas sobre o processo de seleção. Houve a precaução de não selecionar longas ficcionais consagrados31abrangendo “materiais de obras de ficção, documentários, cinejornais, filmes domésticos e filmes científicos” e “sem avaliação subjetiva do conteúdo das obras ou curadoria” (Relatório 2016). A seleção priorizou a urgência pela deterioração do material e não pelo conteúdo. O aspecto crítico nesse fluxo consiste no que não estava sendo selecionado, e que possivelmente estava incrementando ainda mais o ostracismo da obra. Ao longo do processo de análise, materiais indicados para duplicação eram avaliados como não processáveis e, pelo potencial de unicidade, ainda que com esperança no surgimento de algum material, impossível não encarar como a morte da obra. Inúmeros materiais estavam tão deteriorados que não possuíam condições de duplicação na íntegra, e os novos materiais gerados muitas vezes continham as marcas fotográficas da deterioração. Durante este fluxo, foi utilizado o estoque de película comprada nos anos anteriores – que foi findando ao longo dos anos, sem renovação.
As eventuais mortes de obras e as especificidades de processamento suscitaram a necessidade de criar uma metodologia que avaliasse e documentasse a situação da obra, a partir de determinado conjunto de materiais, para nortear as ações de preservação e acesso. Assim surgiu o que foi denominado como “status de preservação”, categoria que, além se integrar à documentação interna, foi incorporada nas comunicações aos detentores de direitos das obras, com observações como “indicada para processamento” ou “necessidade de prospecção de novos materiais”.32 Uma vez que essas categorias são mutáveis uma vez que a condição dos materiais pode mudar, a data do status era tão importante quanto o próprio status como informação.
A plataforma de dados da Cinemateca Brasileira é o WinIsis33 um software bastante limitado como ferramenta de análise de dados de forma mais complexa. A retomada de trabalhos de análise do acervo audiovisual, a criação de novos materiais e a movimentação demandavam atualização constante da base de dados de materiais audiovisuais, que foi interrompida devido à detecção de problemas estruturais na própria base – com o risco de corrupção de dados. Em paralelo, o projeto de código aberto e baseado na web Trac.34 foi estruturado e normatizado para documentação interna – essencialmente documentação fixa em formato Wiki e sistema de tarefas por tickets. Essa intranet “possibilita manter a horizontalidade da informação em relação aos demais setores, a colaboração na construção da documentação, a perenidade e a organização da informação em uma mesma plataforma, […] utilizada para documentar procedimentos internos diversos; normas e bulas de preenchimento de documentos; relatórios e textos referentes à instituição; informações referentes a solicitações externas e dados de materiais analisados e processados”, de acordo com o Relatório de 2017. O esforço por manter uma documentação interna acessível, horizontal e transparente, condizente com o caráter de uma instituição de memória, não alcançava as comunicações com a Acerp e os projetos elaborados pela equipe e encaminhados aos Ministérios. Um elemento importante para o progresso dos trabalhos foi o investimento em desenvolvimento de tecnologia, como documentado no Relatório de 2017, o que permitiu a análise de informações da base de dados de forma dinâmica e a busca por soluções para fomentar a autonomia da instituição. Merece destaque o projeto ClimaCB, criado para o monitoramento on-line da climatização, uma combinação de software e hardware de código aberto, cujas orientações e códigos estariam disponíveis em Git, para a livre utilização. Infelizmente, a publicação não foi efetivada. A participação da CB à frente de discussões técnicas e na publicação de proposições e soluções tecnológicas é ansiada, considerando seu potencial caráter medular, no âmbito da preservação audiovisual.
No período de dois anos durante o Contrato de Prestação de Serviços, Olga Futemma mantinha reuniões com a equipe técnica para compartilhar notícias, impressões e estratégias. Os eventuais encontros reforçavam a noção da proporção e da força da equipe, e serviam como injeção de ânimo. Outro elemento importante de coesão como equipe foi a construção de um novo site – o anterior tinha navegabilidade e ferramentas obsoletas. Um momento de visibilidade foi a realização de uma vinheta pela equipe técnica, mostrando o histórico da logomarca da instituição, criada em 1954.35
A equipe do setor de Preservação tinha um equilíbrio entre técnicos antigos na instituição, que garantiam uma necessária continuidade de fluxos, e técnicos que ali trabalhavam pela primeira vez, que proporcionavam um frescor na avaliação de fluxos e processos do setor. As dificuldades nas relações interpessoais em anos anteriores e a insegurança ocasionada pela crise de 2013 eram as referências negativas a serem evitadas.
O ano de 2016 ficou marcado pela autonomia e intensa comunicação da equipe técnica, mas também pelos percalços. Em maio foi lançado um edital para seleção de uma Organização Social (OS) para empreender a gestão da CB, pela então equipe do MinC do governo Dilma Rousseff. Pouco depois ocorreu o golpe misógino, caracterizado como um processo de impeachment da presidenta. Tão logo o novo presidente assumiu, quis acabar com MinC, mas voltou atrás, após forte pressão popular. O novo Ministro da Cultura cancelou o edital da contração da OS para a CB, que foi lançado meses depois, com alterações.
Em julho houve mais uma surpresa: a eliminação, por uma reestruturação do MinC, de cinco cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) da instituição, ocupados então pela diretora e por técnicos. A direção da CB seria ocupada por uma indicação do Ministério, sem a devida expertise e sem a participação do Conselho, dado inédito à época. Foram enviadas cartas de associações e o Conselho da CB lançou um manifesto.36
pela revogação das demissões e pela vinculação da Cinemateca ao Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), o que auxiliou a reversão do corte do DAS da diretora e viabilizou a contratação de técnicos que ocupavam outros cargos, de outra forma.
Nos meses seguintes foi batalhado junto à SAv/MinC uma forma de evitar o intervalo entre o contrato de prestação de serviços com a Acerp – que terminaria em dezembro – e a implementação do Contrato de Gestão com a OS vencedora do edital. A solução encontrada, um dia antes do término do contrato, foi sua extensão até abril de 2017, mas “como o valor residual não é suficiente para remunerar por quatro meses todos os técnicos anteriormente contratados, foi preciso reduzir a equipe (em cerca de 75%) e, como consequência, frentes de trabalho”, segundo o Relatório daquele ano. O ano terminou com uma mistura de entusiasmo, pela celebração do centenário de nascimento do Paulo Emílio – com o lançamento de um esmerado site,37 de cursos ao público externo e publicações –, e de desânimo pelo corte da equipe, que só seria retomada em proporção similar em junho de 2017. É visível o impacto da forte redução dos técnicos, em um comparativo dos fluxos de trabalho nos Relatórios de 2016 e 2017, como pode ser explicitado pelos resultados do laboratório de metragem de material processado:
Em maio de 2018 foi celebrado o contrato com a OS, seguido por uma cerimônia com a presença do então Ministro da Cultura, que clamou que “a crise acabou” com o novo modelo de gestão. A Acerp, titular do contrato de prestação de serviços desde 2016, foi a OS selecionada no Edital. No caso da Cinemateca Brasileira, a costura jurídica do contrato de gestão por OS iria contribuir para a crise atual: a legislação não permitia que a Acerp firmasse um contrato de gestão diretamente com o Ministério da Cultura (órgão ao qual a Cinemateca estava vinculada), pois já tinha um contrato com o Ministério da Educação (MEC), então a gestão da Cinemateca foi oficializada por um aditivo ao contrato principal.38
Após a assinatura, a Acerp designou uma nova diretora para a Cinemateca, sem consulta ao Conselho, então relegado ao ostracismo. A primeira ação da Acerp com forte impacto na dinâmica da equipe técnica foi o estabelecimento de um núcleo de Atendimento para se dedicar ao crescente número de solicitações, sobretudo de acesso ao acervo audiovisual. Os serviços dos demais setores e o acesso ao acervo documental continuavam sendo viabilizados, mas, com o novo fluxo, se formou um gargalo no acervo audiovisual. Toda solicitação era registrada, respondida e eventualmente atendida, em teoria, considerando a ordem de chegada, a possibilidade de execução e os tempos de tramitações dentro da instituição. Apesar desse protocolo estabelecido pela equipe, um sinal da subjugação da CB seria a intensificação de projetos furando a fila, por determinação do ministro ou da diretoria da Acerp, o que gerava desconforto e inconformidade em parte da equipe.
Para a equipe de Preservação, o núcleo de Atendimento significou não ter mais contato com pesquisadores e produtores, que estavam acostumados com a maior agilidade que a expressiva equipe conferia antes de 2013 – e ficavam frustrados com a limitada capacidade de resposta impressa pela equipe reduzida. Ademais, o diálogo com produtores e pesquisadores – e suas práticas – denotava incompreensão da importância da preservação. Ou ainda, uma visão curta, até em termos de mercado, como a demanda para retirada de materiais para digitalização e licenciamento sem o processamento tecnicamente necessário.39 Outro indício da incompreensão e desrespeito com o viés da preservação é a não execução das contrapartidas especificadas pela CB. Relação elegantemente comentada por Olga Futemma, no Relatório de 2016: “algumas das situações ruins que enfrentamos decorreram de: prazos exíguos; a total desconsideração da necessidade de uma contrapartida – não em termos monetários, pois a Cinemateca não pode cobrar [à época] , mas em ações que deveriam estar previstas em seus projetos e que permitissem ampliar o acervo […]; a incompreensão de que materiais únicos (de preservação) não devem sair do acervo sem supervisão […]”. Ela acrescenta que “é preciso, portanto, continuar a empreender esforços para a mudança da concepção do bem público como algo de que se possa dispor livremente para a consecução de projetos privados, e para a compreensão da necessidade de, ainda na fase de elaboração, consultar sobre a viabilidade do projeto com a Cinemateca, no que diz respeito aos materiais pretendidos e aos prazos necessários para sua disponibilização. São duas condições essenciais para um planejamento que beneficie o solicitante e o acervo”.
Em setembro de 2018, antigos membros do Conselho emitem uma Notificação Extrajudicial ao MinC, requerendo a “revogação dos atos […] e normas que violem a autonomia técnica, administrativa e financeira asseguradas na escritura de incorporação da Fundação Cinemateca Brasileira […], além de: 1) Constituição de novo Conselho Consultivo com observância à necessária autonomia do órgão; […] 3) Retorno da Cinemateca Brasileira à estrutura do IPHAN”. A notificação menciona ainda a “omissão da SAv diante do incêndio [de 2016 … e] que a Cinemateca Brasileira nem mais consta da estrutura do Ministério da Cultura e nem mereceu nenhum cargo público comissionado”.
Gestão por OS na Cinemateca Brasileira
No momento de maior solidez da instituição, na primeira década deste século, a manutenção de seu corpo funcional foi um desafio constante. Os técnicos eram contratados por projetos com duração específica, por diferentes formas de vinculação.40 Essa dinâmica imprime fragilidade e instabilidade aos fluxos de trabalho, compromete estratégias e soluções estruturais, além de vulnerabilizar a própria equipe técnica.41 O modelo de gestão por OS seria uma solução desejada para viabilizar a contratação da equipe técnica de forma estável, depois de anos de penúria, conforme evidenciado por Futemma em e-mail na lista da ABPA: “esta discussão [de modelo de gestão de OS] ocorre há oito anos, envolvendo MinC, SAv e Conselho e equipe da Cinemateca. Temos grandes expectativas de que, até o final deste ano, um novo modelo de gestão permita à Cinemateca Brasileira exercer todo o seu potencial em prol do patrimônio audiovisual brasileiro”.42
O modelo de gestão por OS foi a solução deliberada depois de muitos anos de instabilidade do corpo técnico. Essa perspectiva era calcada também na possível preferência de uma OS criada especialmente para gerir a CB, a Pró-Cinemateca, OS criada em 2014 por membros do conselho e da SAC, com a finalidade única de fazer a gestão da instituição, que potencialmente teria a participação de profissionais da área na construção de um Plano de Trabalho – documento medular para a gestão em si e um dos critérios de seleção no Edital. A Pró-Cinemateca se qualificou para o 1º Edital lançado, mas não para o 2º Edital, devido à nova exigência de experiência prévia da instituição na gestão de recursos públicos – não havia experiência da instituição, pois havia sido criada recentemente, mas dos representantes e conselheiros, sobretudo experiência na própria Cinemateca, o que, na prática, poderia ser mais relevante do que o histórico de gestão da empresa em si.
Hoje o modelo de gestão por OS, após controvérsias em torno da gestão de outras entidades públicas, casos de corrupção e uma série de publicações sobre o tema na academia e na internet, é rebatido de forma ampla.43 O modelo é especialmente arriscado para instituições de patrimônio cultural em um contexto de insuficiência de recursos do Governo, onde fluxos de trabalho essenciais para a conservação do acervo (muitas vezes custosos e de baixa visibilidade) podem ser ofuscados para o benefício de ações com maior visibilidade pública. A confecção de um plano de trabalho sem a participação efetiva da equipe técnica pode comprometer seus objetivos primordiais. Conforme diagnosticado por Fabiana Ferreira:
“Um outro problema dessa gestão é que a justificativa da liberdade para captação de recursos por outras vias que não as estatais acaba também ficando à mercê do Estado. Isso se dá porque, no Brasil, o apoio das instituições privadas para a cultura não é tradição. A iniciativa privada no Brasil não apoia iniciativas culturais. Tradicionalmente, famílias milionárias e corporações brasileiras não realizam doações ou investimentos nos equipamentos de cultura, menos ainda para aqueles que não dão visibilidade à marca”. (2020, p.110) 44
No caso da CB, a gestão por OS possibilitou a contratação por CLT45 de boa parte da equipe, cuja escolha felizmente coube aos coordenadores, sem a intervenção da Acerp. Porém, gradativamente o corpo técnico passou a ser condicionado às diretrizes da Acerp, condição que ficou evidente em reuniões internas, quando não era mais possível desempenhar um papel ativo na prospecção de acervos46 ou falar em nome da instituição sem o consentimento da Acerp. Sinais de mudança foram percebidos nos “modos sociais” da equipe, de forma distópica: a instalação de rede de câmeras como medida de segurança de acervo e equipamentos se concretizou com a gestão da Acerp – abarcando espaços anteriormente utilizados em pausa do trabalho, gerando desconforto com a vigia panóptica moderna.
Cursos internos de assuntos técnicos ou apresentação de fluxos e atividades entre os setores, que eram realizados desde 2017, foram suspensos. A captação de recursos para a Cinemateca constava entre as ações previstas pela Acerp, e o aproveitamento do acervo e das instalações era uma via rápida para esse fim, o que gerou longos períodos com um fluxo constante de montagem e desmontagem de estrutura para grandes eventos, com temáticas variadas, por vezes distante da cultura e do audiovisual. Como não foram emitidos relatórios de 2018 e 2019, na gestão da OS, não é possível o acesso à informação sobre esses eventos. A ausência de publicação de relatórios é um perigoso indício da falência do modelo de OS para a Cinemateca, pois são documentos fundamentais para prestação de contas e transparência da gestão da instituição. No período foram criados relatórios de cumprimento de metas para o Ministério, mas o caráter do documento é técnico e pouco informativo, além de não ser público. Foi proposto um Código de Ética e Conduta da Acerp para os funcionários da CB, apresentado em um evento sobre o compliance da empresa – a menção de crenças religiosas no evento foi uma demonstração significativa da distância entre a Acerp e a missão institucional da CB.47Ainda, ficou explícita e evidente a inaptidão da empresa no desembaraço de burocracias para aquisição de equipamentos para o laboratório, o que afetou planos de trabalho desenhados segundo a disponibilidade de tais equipamentos. Solicitações de acesso ao acervo audiovisual para a utilização na programação da TV Escola tornaram-se prática corrente – enquanto a Acerp desatendia algumas necessidades apontadas pelo corpo técnico. As propostas da programação para a sala de cinema foram impactadas e condicionadas – como apresentar a ideia de uma mostra de Fassbinder para uma diretoria que fazia piada homofóbica nas situações de conversa fiada anteriores às reuniões?
O cancelamento em cima da hora da edição de 2019 da CryptoRave48 pela equipe da própria Cinemateca foi sintomático, por receio de represália. Um símbolo incontestável da ocupação pela Acerp foi a criação de um novo site, sem participação ativa do corpo técnico da Cinemateca nas decisões editoriais. Como exemplo de equívoco, a ferramenta dinâmica do calendário de programação não era compatível com a linguagem do novo site. Portanto, o novo site passou a ter um design mais atualizado, porém menos funcional. A Acerp de imediato implementou uma logomarca intermediária (dizeres ‘cinemateca brasileira’ em cor branca sobre fundo vermelho), em substituição da logomarca de 1954, criada pelo celebrado designer Alexandre Wollner. A Acerp encomendou o desenho de uma nova logomarca, apresentada ao corpo técnico sem espaço para deliberação, cujo conceito e diagramação surpreendem pela semelhança com a logo do Curta Cinema - Festival Internacional de Curtas do Rio de Janeiro. Outro aspecto delicado, pois a Acerp é sediada no Rio de Janeiro e a Cinemateca em São Paulo.49 são os gastos de traslado, hospedagem e diárias de alimentação de diretores, gerentes e membros da consultoria jurídica entre as cidades – esses recursos acumulados significam um montante considerável, que poderia ter sido investido na própria Cinemateca.
Um símbolo inquestionável do insucesso do modelo de gestão de OS para a Cinemateca foi a dissolução do Conselho Consultivo, composto por representantes do poder público e da sociedade civil, cuja existência está prevista na ata de incorporação da instituição ao governo federal, de 1984. Sem diálogo com o Conselho, vários diretores foram apontados pela Acerp, sem experiência na área de memória ou preservação, e acabaram por alienar a equipe técnica dos rumos da instituição. Além disso, a Cinemateca, que historicamente se mantinha apartidária, por meio da Acerp, tornou-se o destino de pessoas associadas ao partido de extrema direita do presidente à época, em cargos diversos (administrativos e de comunicação, sobretudo), sem a expertise necessária nem entendimento da instituição, e que frequentemente apresentavam as áreas técnicas aos visitantes sem o devido acompanhamento da equipe técnica, fragilizando mais os esforços de conservação. Episódios com muita repercussão foram a presença de militares nas dependências da instituição50 e a tentativa fracassada de realização de uma mostra de filmes militares. Ao longo dos quatro anos da gestão da Acerp, a partir do exame da dinâmica interna, fica explícito o quanto a equipe técnica era autônoma e tinha projetos (Acerp como prestadora de serviço, de 2016 a 2018) e o quanto houve de perda da autonomia no modelo de gestão por OS (2018 em diante).
O limbo administrativo em que os dez servidores públicos alocados na instituição consiste em outra questão. Eles continuaram em seus postos desde o início da gestão por OS, quando a CB deixou de ser uma coordenação-geral da SAv do antigo MinC. Alguns dos servidores já estavam na instituição há mais de três décadas. Antes da assinatura do contrato, foi garantido aos servidores que, com a cessão para a OS, não teriam prejuízos em seus salários e benefícios. Contudo, após a assinatura do contrato, o entendimento mudou e a cessão nunca foi oficializada. Apesar dessa situação, o ministério orientou os servidores a prosseguirem com suas atividades na Cinemateca. Após um ano e meio de descaso e mensagens contraditórias, tiveram que abandonar de forma brusca a Cinemateca, para trabalhar no Escritório Regional do Sudeste do Ministério, em São Paulo – sem infraestrutura mínima para recebê-los. Além da súbita suspensão de sua atuação na CB, essas pessoas respondem a um processo de reposição ao erário, para devolução à União da Gratificação de Desempenho de Atividade Cultural (GDAC) – que representa parte significativa dos vencimentos – do período da assinatura do contrato de gestão da Acerp até a ida ao escritório do Ministério, por terem trabalhado “cedidos” para a OS.
Apesar de a Acerp ter assumido as relações institucionais de forma mais ampla, excepcionalmente a relação com a FIAF seguiu sendo feita por Olga Futemma e coordenadores, com a emissão de minuciosos relatórios anuais à Fundação e a pronta pesquisa de informações solicitadas por associações filiadas à FIAF. Porém, entre os anos 2016 a 2019, não foi possível a representação de Futemma ou dos coordenadores nos Congressos de Bologna, Los Angeles, Praga e Lausanne.
Crise de 2020
Em fevereiro de 2020 a instalação secundária na Vila Leopoldina foi afetada por uma enchente, devido às fortes chuvas e à ausência da gestão adequada de galerias pluviais do bairro, aliada à intensa poluição do rio Pinheiros, a menos de 0,5 km da Cinemateca. A água de esgoto atingiu mais de um metro de altura, destruindo parte do acervo de película e de equipamentos, inclusive últimos materiais de longas e curtas de ficção, muitos elementos únicos de cinejornais, publicidade e trailer. Os danos ao acervo documental não foram considerados significativos, por se tratar de material duplicado. Instalações e equipamentos do galpão foram afetados e danificados. Após uma higienização profunda no ambiente pela equipe de limpeza, uma parcela da equipe técnica foi deslocada para limpeza, organização e resgate dos materiais atingidos. Não foi executado um plano emergencial por parte da Acerp ou da SAv para a necessária avaliação e processamento dos acervos audiovisual e de equipamentos, os mais atingidos, como a contratação de uma equipe técnica extra de forma temporária ou, até, a permissão de voluntários.51 A catástrofe não foi noticiada espontaneamente devido à falta de articulação entre a SAv e a Acerp diante da tragédia. A equipe técnica não poderia tomar a iniciativa de tornar pública a enchente. A exígua equipe estabeleceu turnos diferenciados, considerando a alta toxicidade do ambiente e a carga exaustiva, acentuada pelas altas temperaturas do galpão sem climatização e com restrita ventilação.52 Materiais em película foram selecionados e transladados para a sede principal para avaliação e processamento no laboratório, mas havia pouca película disponível para duplicação emergencial de rolos únicos danificados. Pelo alcance dos danos no espaço da CB e, sobretudo, nos acervos audiovisual e de equipamentos, pela inação da SAv e da Acerp, e pela crise que se sucedeu depois, interrompendo o trabalho de resgate e pesquisa, essa enchente se equipara, como catástrofe, aos sucessivos incêndios sofridos pela instituição, que “são metáfora da fragilidade da construção de uma política de preservação audiovisual que se esvai em chamas a cada mudança de Governo, de criação de entidades, de novos agentes” (Ferreira, 2020, p.23).
Desde a crise de 2013, o orçamento repassado pelo Ministério foi aquém das necessidades, o que se traduziu em equipes menores que o planejado para execução dos planos de trabalho. Ao final de 2019 instalou-se mais uma crise, quando o então Ministro da Educação decidiu não dar continuidade ao projeto da TV Escola – objeto principal do contrato da Acerp com o MEC –, não renovando o Contrato de Gestão com a Acerp (supostamente por uma cizânia pessoal do Ministro com um dos diretores). Uma vez extinto o contrato-principal com o MEC, todos os demais contratos foram encerrados – apesar do aditivo referente à CB ter duração até 2021 – o que deixou a CB à deriva administrativamente. A Acerp passou alguns meses buscando contornar a decisão e tentando obter recursos com a SAv, com a Secretaria Especial da Cultura e com o Ministério do Turismo, sem sucesso. O ano de 2020 foi repleto de notícias absurdas de decisões do governo envolvendo a Cinemateca,53 causando comoção e repercussão em redes sociais e gerando matérias na mídia. Em abril a Acerp parou de pagar as empresas terceirizadas e a equipe técnica. Antigos membros do Conselho lançaram um manifesto em maio.54
Foi iniciada uma ação civil pública pelo Ministério Público Federal contra o governo federal, pedindo a renovação emergencial do contrato com a Acerp que, até o fechamento deste texto, tinha o entendimento de que a situação estaria sanada com a contratação dos serviços essenciais (segurança, bombeiro) – porém, a ação está em andamento e há expectativa de uma nova decisão favorável à CB. Foram formadas e fortalecidas redes de resistência e protesto, de forma difusa, com diversos atores, que estreitaram a comunicação ao longo do tempo: Cinemateca Viva, Cinemateca Acesa, e representantes da Associação Paulista de Cineastas (Apaci),55 criando o movimento SOS Cinemateca. Estes grupos estiveram muitos ativos na realização de atos pela Cinemateca e na articulação política com gestores municipais e federais. Por parte do corpo técnico da CB, a porta voz não foi a gerência ou as coordenações, mas a representação de funcionários como um grupo.56
Os funcionários, que seguiam em trabalho remoto (quando possível), entram em greve em junho, com o auxílio efetivo do Sindicato. Neste mês é iniciada uma campanha por iniciativa dos trabalhadores da CB para arrecadar recursos para os colegas em situação mais vulnerável pela falta dos salários e benefícios, ainda mais fragilizados com a pandemia de Covid-19. A campanha teve numerosas contribuições de pessoas e instituições de todo o mundo.57 Foram feitas doações diretas à própria instituição, como a de um diretor anônimo, que doou para o conserto do gerador. Em julho foi realizado um debate na Câmara dos Deputados,58 com a presença de parlamentares, de diferentes atores da cadeia do audiovisual e da sociedade civil, um símbolo da repercussão e engajamento inéditos em torno da Cinemateca. De certa forma evidenciou também a necessidade de protagonismo e de didática por parte de profissionais da área pela profusão de termos inadequados e imprecisos ao defender a Cinemateca.59 A diretoria da Acerp emitiu poucos comunicados ao corpo técnico diretamente, e as informações eram repassadas, de forma irregular, pelos coordenadores. Em junho foi emitido um comunicado da diretoria (em documento não datado!), com solidariedade “com as dificuldades que todos estão passando, mas saibam que estamos fazendo o possível e impossível, estamos fazendo de tudo que está ao nosso alcance”, com o comprometimento de, “assim que receber do Governo Federal, a primeira providência será pagar salários e rescisões” – quando era notório que não haveria nenhum repasse por parte do Governo Federal. Considerando a ausência de recursos em 2020 para a Cinemateca, a enchente, a crise decorrente da pandemia de Covid-19, o trabalho remoto, a suspensão de salários e benefícios, o comunicado é um símbolo do descaso e desrespeito da Acerp com seu corpo funcional. Após a entrega de chaves da CB ao Ministério em 7 de agosto,60 a Acerp demitiu seus funcionários (sem pagamento de salários atrasados e verbas rescisórias).
Conforme notado na Carta de Gramado de 2020, “após inúmeros telefonemas, mensagens, consultas entre as partes e adiamentos, foram garantidos os serviços básicos e emergenciais de água e de luz […]; foram contratados os serviços de limpeza, embora a empresa não seja especializada; foram contratados serviços de manutenção dos equipamentos de climatização, embora a empresa não ofereça a expertise necessária; foram contratadas uma mini brigada anti-incêndio composta por dois funcionários e uma empresa de vigilância patrimonial das dependências. No entanto, entre as necessidades emergenciais falta o fundamental trabalho dos funcionários especializados sem os quais o acervo não estará preservado, mesmo com a retomada dos serviços básicos acima descritos”.61 Sem o acompanhamento técnico, o menor dos incidentes nas áreas de acervo pode gerar problemas com consequências drásticas e irreversíveis. Trata-se da primeira vez que em que é impossibilitada a entrada na instituição, por qualquer membro do corpo técnico.
À ocasião da entrega das chaves ao Ministério do Turismo, foi indicado que um edital para a contratação de uma nova OS seria lançado em breve, o que ainda não ocorreu. Há uma previsão orçamentária de R$ 12,5 milhões para a Cinemateca em 2020. Caso este recurso não seja utilizado ainda neste ano, não poderá ser somado aos parcos R$ 4 milhões previstos para 2021. Vereadores de São Paulo de diferentes partidos políticos organizaram um fundo de emendas parlamentares para a Cinemateca, com apoio da Spcine, empresa municipal de audiovisual de São Paulo. A aplicação de recursos municipais em uma instituição federal demanda uma articulação jurídica inédita, que está sendo construída pela SAC para a contratação emergencial de um pequeno corpo técnico. Hoje, os grupos da Sociedade Civil seguem ativos, com a tentativa de acionar entidades e dar continuidade à mobilização. A próxima grande ação está prevista para 27 de outubro, Dia Mundial do Patrimônio Audiovisual - UNESCO.
É urgente a criação de uma solução imediata para a viabilização de uma equipe técnica ainda no ano de 2020, para que o acervo não siga desacompanhado. A criação de mecanismos para a gestão da instituição a médio e longo prazo, de forma resiliente e sustentável, condizente com a necessidade de constância dos trabalhos no acervo e de manutenção da equipe técnica também é urgente. Considera-se como necessária e fundamental a abertura de concursos públicos para os cargos técnicos, respeitando as especificidades, o que poderia conferir a desejada estabilidade. Conforme diagnosticado na Carta de Ouro Preto de 2020:
“preservação do patrimônio cultural é dever constitucional do Estado brasileiro e, portanto, é preciso recuperar o protagonismo do poder público na gestão de instituições de patrimônio audiovisual, retomando os processos de abertura de concursos públicos e de implementação de planos de gestão pensados em conjunto com a sociedade civil, diretiva prevista na Recomendação sobre a Salvaguarda e Conservação das Imagens em Movimento, da UNESCO, de 1980” (Carta de Ouro Preto de 2020)
Uma ideia recorrente nas numerosas discussões on-line é o retorno da Cinemateca Brasileira para uma instituição de memória e patrimônio do governo federal – IBRAM ou o IPHAN, ao qual a CB foi vinculada até 2003, quando passou a ser vinculada à SAv. Foi inclusive esse vínculo ao IPHAN que proporcionou a continuidade da CB no início da década de 1990, quando o governo federal promoveu um desmonte de políticas e instituições de cinema. O IBRAM é uma autarquia vinculada ao Ministério do Turismo, que abrange trinta museus federais.
Depósito Legal e o Mercado do Audiovisual
Apesar do indubitável dever do Estado (e sua evidente negligência), reitero que o interesse e a preocupação com a implementação de uma política de preservação devem ser de todos os elos da cadeia do audiovisual. Temos como desafio o entendimento geral – cuja relação de valores foi construída, por décadas, pelo próprio mercado – de que o “bem simbólico da memória é inferior ao bem simbólico de um longa-metragem exibido nos cinemas dos shoppings” (Ferreira, 2020, p.111). Possivelmente a prosperidade do FSA (e o aumento de investimentos em desenvolvimento, produção, distribuição e exibição), unida à inação dos elos da cadeia produtiva do audiovisual em relação à preservação se relacionam diretamente com a dimensão da atual crise do patrimônio audiovisual. A ABPA reiteradamente tem pleiteado assento no Conselho Superior do Cinema (CSC) e no Comitê Gestor do FSA, sem sucesso. No debate “Fronteiras entre a indústria, mercado e arquivos – conteúdo, fomento e regulação”, na CineOP de 2018, um representante da indústria audiovisual no Comitê Gestor do FSA sugeriu a busca de outro caminho de financiamento para a preservação, distinto do FSA. Quando este profissional levanta essa possibilidade (e ele é só um exemplo da postura de outros produtores), não compreende a importância da preservação para toda a cadeia nem que também é sua função defender a Cinemateca, bem como outras políticas para a gestão do patrimônio audiovisual, de forma ampla. Nem que seja pelo viés personalista, considerando que algum asset seu possa estar lá: a matriz de uma imagem de arquivo para seu próximo filme como produtor; a matriz do seu filme de estreia dos anos 1980; ou os registros domésticos de sua família. Ou, ainda, pelo fato de que a atuação da Cinemateca em discussões, publicações, fóruns e em pesquisa de tecnologia possa beneficiá-lo de alguma forma. Como afirma Paulo Emílio, “não se faz bom cinema sem cultura cinematográfica e uma cultura viva exige simultaneamente o conhecimento do passado, a compreensão do presente e uma perspectiva para o futuro. Enganam-se os que confundem a ação das cinematecas com o saudosismo” (1982, p.96). A cadeia produtiva já resmungou quando foi debatida a necessidade de investimento no gigante passivo da preservação audiovisual para atender à própria cadeia produtiva e, até, explorar comercialmente os acervos. O business model não fecha enquanto não tivermos um investimento massivo para dar conta de décadas de dificuldades e estagnação. Eu resmungo de volta com esse gráfico:63
Apesar do indubitável dever do Estado (e sua evidente negligência), reitero que o interesse e a preocupação com a implementação de uma política de preservação devem ser de todos os elos da cadeia do audiovisual. Temos como desafio o entendimento geral – cuja relação de valores foi construída, por décadas, pelo próprio mercado – de que o “bem simbólico da memória é inferior ao bem simbólico de um longa-metragem exibido nos cinemas dos shoppings” (Ferreira, 2020, p.111). PossivEm abril de 2017, foi publicado o Plano Anual de Investimentos do FSA para o ano de 2017,64 no qual foram anunciados, como apoio, R$ 10,5 milhões para a Cinemateca Brasileira. O valor equivale a 1,4% do total anunciado no documento. O valor nunca foi executado, com a justificativa de que o recurso do não reembolsável65 teria terminado. Em maio de 2018 foi lançado o Plano Anual de Investimentos de 2018,66 com a previsão de R$ 23,375 milhões para investimentos em Preservação e memória. Em dezembro daquele ano foi lançado pela SAv o Edital de Restauro e Digitalização de Conteúdos Audiovisuais. Tratava-se de recursos para restauração ou digitalização de obras para empresas do audiovisual, com a possibilidade de retorno financeiro, e contou com a atuação de um grupo de trabalho com a participação de técnicos de preservação da Cinemateca Brasileira na construção do documento e das diretrizes técnicas para a digitalização e restauração. Sob a ótica de profissionais do setor, o Edital estava destinado somente a produtoras com o viés da distribuição, sendo a preservação secundária. O Edital foi suspenso cerca de quatro meses após a publicação pelo atual governo. Portanto, nenhum recurso do FSA de 2008 a 2018, de um total de um pouco mais de R$ 4,5 bilhões,67 foi de fato investido em preservação.
Atualmente a Cinemateca Brasileira é a única instituição habilitada a receber materiais em Depósito Legal. Desde 2016, a Ancine investiu não mais que R$ 2 milhões na contratação de equipe técnica para análise desses materiais, cujo fluxo de processamento mobiliza diversos setores e técnicos da instituição. Foi reportada alta taxa de reprovação dos materiais analisados e, segundo Gomes (2020), “parece ter como uma das principais causas o grande distanciamento e pouca informação de realizadores/produtores acerca, de maneira ampla, do papel de um arquivo audiovisual, e de maneira mais específica, dos princípios do Depósito Legal”. Contar com a expertise na análise dos materiais sem viabilizar recursos para a preservação desse acervo pode ser considerado como tiro no pé. Os materiais analisados estão inertes em estantes em um ambiente climatizado – à mercê da famosa morte silenciosa.68 É necessário que o mercado participe para garantir um aumento da taxa de aprovação e a criação de condições para preservação de materiais nato digitais no âmbito do Depósito Legal. De maneira ampla, a narrativa e a luta por políticas para o patrimônio audiovisual devem também ser do mercado.
É muito significativo o panorama da Cinemateca apresentado na Carta de Gramado 2020, elaborada pela frente SOS Cinemateca, com adesão de diversas associações – de outras cinematecas, de profissionais e empresas do audiovisual. Um sinal positivo é a inclusão de uma discussão sobre a crise na Semana ABC, organizada pela Associação Brasileira de Cinematografia (ABC), um dos mais significativos eventos em torno da realização audiovisual no Brasil. Mas ainda precisamos de maiores ações de aproximação e de reconhecimento de que esta crise da Cinemateca deve ser preocupação – e requer atuação – de todo o setor.
Conforme apontado na Carta de Ouro Preto de 2020, entre os pontos urgentes para implementação de uma política nacional para a área e os desafios a serem enfrentados está “reivindicar a criação de mecanismos para a ampliação da oferta de obras audiovisuais brasileiras nos catálogos de plataformas de streaming, tendo a garantia de inclusão de obras de diversas épocas, possibilitando o acesso ao vasto patrimônio audiovisual brasileiro”. Qual seria a relação da Netflix (usada aqui como modelo de plataforma), por exemplo, com a necessidade de investimento no patrimônio audiovisual brasileiro? Só uma oportunidade de benfeitoria mesmo, viável por sua presença na lista das 12 empresas que mais lucraram na pandemia. A proposta não é tão absurda, considerando que a empresa no Brasil criou um fundo emergencial de R$ 5 milhões para a indústria audiovisual brasileira, devido ao recesso no contexto da pandemia de Covid-19.69 Obras antigas disponíveis nas plataformas de streaming constituem uma preocupação nos Estados Unidos.70 Em geral, produtores brasileiros não contam com recursos para digitalização e finalização de filmes antigos capazes de atender aos parâmetros técnicos requeridos pela plataforma e, possivelmente, precisam de investimento em advogados para viabilizar o clearance.71 da obra. Que tal então a plataforma lançar uma linha de investimento para obras não contemporâneas? Trata-se de uma ideia que seria contemplada pelo Edital SAv/MinC/FSA nº 24 de dezembro de 2018, linha de Restauro e Digitalização de conteúdos audiovisuais, suspenso em 2019. A saúde das instituições de patrimônio audiovisual beneficia também as próprias plataformas de streaming a médio e longo prazo – considerando, por exemplo, a forte tendência de documentários em torno de imagens de arquivo.72 Como ilustração, o expressivo número dos documentários dos EUA disponíveis na Netflix Brasil, que possui imagens de arquivo como condutores da narrativa, como Wild Wild Country (2018), Disclosure (2020), e as séries Remastered (2018) e Explained (2018). No entanto, comparativamente são poucos os filmes e séries brasileiros que apresentam imagens de arquivo nessa medida, sendo uma exceção O Barato de Iacanga (2019, Thiago Mattar).73
Além da atividade do laboratório da Cinemateca para a preservação de seu acervo, chamo atenção para a confecção de cópias, como a coleção “Clássicos e Raros do Cinema Brasileiro”, iniciada em 2007, que teve sua 4ª edição em 2016, e aquelas feitas para celebrar o Dia internacional do Patrimônio Audiovisual. Destaco, como meio de registro, as cópias em 35mm e digital realizadas em 2016, tal qual consta no Relatório.
A confecção de cópias em 35mm é uma importante função de uma cinemateca com um laboratório fotoquímico, para a preservação e para proporcionar uma experiência de difusão em consonância com o formato original da obra. Considerando que o digital é a forma de ampla circulação, são confeccionados cópias em digital em diversos formatos/fins. No contexto da CB, o esforço de digitalização dessas obras se realizaria mais plenamente com alguma forma de difusão pré-estabelecida, idealmente com a devida curadoria e ações de contextualização. Atualmente, o caminho natural de difusão digital da CB é a inclusão na plataforma Banco de Conteúdos Culturais (BCC).74
“
Dez Filmes Importantes Para a História do Cinema Brasileiro Inacessíveis (ou quase) Digitalmente”, publicado em Cinelimite, expõe a inacessibilidade digital a alguns celebrados, cânones ou raridades de nossa filmografia. Além de ações para o acesso digital, é crucial avaliar se suas matrizes estão fora de risco iminente, e se demandam ações de preservação ou duplicação. A lista de Rafael de Luna me remeteu a “Filmes brasileiros considerados perdidos (ou prestes a sê-lo)”, publicada na extinta revista
Contracampo.75
Distintivamente, a lista de 2001 era sobre a existência/perda de matrizes. Além de alguns títulos que eventualmente foram perdidos, outros tiveram seus (conhecidos) únicos materiais deteriorados, a ponto de inviabilizar um processamento em laboratório. Devido às crises da Cinemateca Brasileira, à paralisia dos trabalhos de pesquisa, das ações de preservação e do processamento laboratorial, a atualização da lista feita em 2001 por Hernani Heffner e Ruy Gardnier seria trágica em extensão e escopo. Seria papel de uma instituição nacional tornar esta lista pública. Além de prestar contas à sociedade brasileira sobre seu patrimônio audiovisual, também pode ser uma estratégia de localização de novos materiais junto a outras instituições e colecionadores privados no Brasil e no mundo. Ainda, e os tantos outros filmes e registros que escaparam de tal investigação e documentação e estão em ostracismo? Quantos filmes existem, cujos únicos materiais são cópias em bitolas inferiores, incompletos, muito deteriorados? Quantos registros audiovisuais brasileiros já perdemos?
Conclusão
“Se perdermos o passado, viveremos em um mundo Orwelliano do presente perpétuo, onde qualquer pessoa que controla o que está sendo divulgado poderá dizer o que é verdade e o que não é. É um mundo terrível, nós não queremos viver nesse mundo.”Brewster Kahle (2014, entrevista para Digital Amnesia, documentário da holandesa VPRO)
“Conhecimento só se efetiva quando é compartilhado” Hernani Heffner (2001, em conversa de corredor na Cinemateca do MAM do Rio de Janeiro)
O audiovisual digital tem sido ferramenta crucial nas lutas por direitos humanos em todos os cantos do país. São registros de despejos forçados de comunidades, da ocupação de aparelhos culturais ou educacionais como forma de protesto, de manifestações, de invasão de comunidades por forças policiais – com altos índices de homicídios da população local, inclusive crianças e jovens –; registros da devastação ambiental fomentada pelo governo atual, da luta por direitos e pela demarcação de terras indígena, e de crimes contra os povos originários. O audiovisual também tem sido utilizado no empoderamento preto e na luta antirracista, na emancipação e afirmação das mulheres por igualdade de oportunidades e contra o machismo estrutural. As redes sociais, com uma profusão de talentos criativos e narrativas, proporcionam os maiores índices culturais desta época. No Brasil, em sentido geral, estas imagens seguem fora do escopo de prospecção das instituições brasileiras, e ainda é tímida a discussão em torno de seu arquivamento e pertencimento ao escopo do patrimônio audiovisual no Brasil. Na perspectiva da preservação, além de todos os desafios inerentes à preservação digital de dados,76 temos o aspecto da efemeridade, pelo vínculo dos dados às corporações.
Os mecanismos de tecnologia persuasiva das redes sociais são utilizados para conduzir comportamentos de indivíduos. Algoritmos são capazes de dar credibilidade ao inverídico, de alavancar o terraplanismo e de colocar #StopFakeNewsAboutAmazon como trend no Twitter, enquanto a boiada do ecocídio passa solta, e o mundo testemunha a Amazônia, o Cerrado, o Pantanal e outros Parques Nacionais destruídos.77 O computador quântico Rehoboam78 é uma alegoria do agora, em uma narrativa explicitada por Shoshana Zuboff em seu livro “Capitalismo de Vigilância”. Vimos, num crescente terror e violência, sucessivas vitórias eleitorais de partidos e movimentos políticos de extrema direita. A circulação de notícias falsas nas redes sociais aumentou o poder de destruição do Covid-19. A contrainformação, deep fake e robôs de fake news têm conexão com o mundo descrito por Brewster Kahle, fundador do Internet Archive, citado acima. Podemos perder o passado e, até, o presente, pela fragilidade do tecido da informação, pelo potencial de manipulação e pela desinformação.79 O atual presidente do Brasil, quando deputado, à ocasião do processo de impeachment/golpe da presidenta Dilma Rousseff, votou pela memória do maior torturador da ditadura militar, que comandou as sessões de tortura contra a ex-presidenta. Falhamos em não ter mostrado e visto o suficiente de O caso dos irmãos Naves (1957, Luis Sérgio Person), Iracema - uma transa amazônica (1974, Jorge Bodansky/Orlando Senna), Tarumã (1975, Mário Kuperman), Eles não usam black-tie (1981, Leon Hirszman), Pra Frente, Brasil (1982, Roberto Farias), Cabra marcado para morrer (1984, Eduardo Coutinho), Que bom te ver viva (1989, Lúcia Murat), Ação entre amigos (1998, Beto Brant), Cidadão Boilesen (2009, Chaim Litewski).80 De forma que fosse impossível banalizar o ato na Câmara dos Deputados, de tal forma que nenhuma mulher votasse nele para presidente dois anos depois. Agora não podemos deixar de preservar estes filmes e os que virão depois de Orestes (2015, Rodrigo Siqueira), Pastor Cláudio (2017, Beth Formaggini) e Torre das Donzelas (2019, Susanna Lira).
Uma parcela expressiva do patrimônio audiovisual brasileiro já se perdeu ao longo do século passado. Além dos recorrentes incêndios à época dos primeiros cinemas, das ondas de destruição ativas (de filmetes curtos na consolidação do longa-metragem como formato, do silencioso com a chegada do cinema falado, na substituição do nitrato pelo acetato), muitos acervos se dispersaram, foram desmantelados, escamoteados, e os que chegaram aos arquivos de filmes já chegaram debilitados. Ainda, a demora em reconhecer a importância do patrimônio audiovisual, a ausência de políticas públicas para a sua gestão e a oscilação de recursos nas instituições acarretaram mais perdas. Com o advento do digital, há um agravamento – tanto pela preservação do que hoje é prospectado quanto pelo que está fora do escopo de prospecção. A crise atual da Cinemateca é gravíssima e demanda medidas urgentes do poder público e da cadeia audiovisual. Apesar do poder de destruição do atual governo e da paralisia dos trabalhos por tantos meses, encorajada pelas muitas discussões que estão sendo realizadas, pelas articulações em andamento e pelos movimentos em apoio à Cinemateca, quero terminar com algum tom de otimismo. Por acreditar no potencial da Cinemateca para promover debates e exibição de filmes, para efetivar o acesso às mais olvidadas coleções, ser um espaço para pesquisa, prover referência imagética do passado e subsidiar pesquisa tecnológica; para cativar crianças e jovens com a telona, apresentar o pré-cinema e as tecnologias do audiovisual em um museu, e para engajar o bairro e a comunidade vizinha. Acrescente-se para vários outros modos de uso criativo do acervo e das ferramentas que demoraremos a exercer, devido às sucessivas crises que aumentam o passivo de trabalhos, aceleram a deterioração do acervo e limitam o poder de alcance da instituição. Neste momento fica ainda mais evidente o fato de que a Cinemateca está incluída no macro projeto de devastação da cultura e do patrimônio brasileiro e, a sua importância como uma força para reagir contra este projeto, portanto, cresce cada vez mais.
Agradeço Aline Machado pela revisão minuciosa.
1. O Ministério da Cultura foi extinto no primeiro dia do governo; foi incorporado inicialmente ao Ministério da Cidadania e, posteriormente, ao do Turismo. Até o momento, a Secretaria Especial da Cultura já teve cinco titulares sem comprovada expertise, e outras instituições de patrimônio cultural passam por agudas crises, como a Fundação Casa de Rui Barbosa e o Centro Técnico Audiovisual (CTAv). A Agência Nacional do Cinema (Ancine) não repassou recursos já comprometidos e não lançou novos editais. Destaca-se que a Constituição Federal, que rege a democracia brasileira, prevê em seu Art. 215 que o “Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”; e em seu Art. 216, que o “poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro”.
2. De 2016 a 2020 trabalhei no departamento de Preservação de Filmes da Cinemateca Brasileira. Compartilho reflexões subjetivas a partir de minha experiência, com ênfase nas atividades do departamento.
3.
CineOP 15 years: Live with Hernani Heffner, Cinemateca do MAM manager. September 2020.
https://www.instagram
.com/tv/CEC_cUVlbK6. Acesso em: 18 set. 2020.
4. Por meio de uma política descentralizadora do Ministério da Cultura foram lançados editais de desenvolvimento e produção, com cotas para estados usualmente com restrito investimento no audiovisual, e projetos de baixo orçamento, editais específicos para novos diretores, mulheres e povos nativos
.5. Regulamentado em 2007, o FSA é retroalimentado por um fluxo do imposto Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine), coletado a partir de todas as janelas do audiovisual, e investido em novas produções, linhas de desenvolvimento, distribuição de produções para cinema e televisão e jogos eletrônicos. De 2008 a 2018 foram investidos, no total, cerca de R$ 4,5 bilhões.
6. Um exemplo emblemático desta dinâmica ocorreu em 2008, com a presença do então diretor-executivo da Cinemateca Brasileira na 3ª CineOP, cuja temática é
Política Nacional de Preservação Audiovisual: necessidades e desafios. Ao longo do evento ele se posicionou com firmeza contra uma articulação das demais instituições, a criação de diálogo destas com o representante do Ministério da Cultura no evento e a criação da ABPA - Associação Brasileira de Preservação Audiovisual.
7. Dentre as propostas do Simpósio sobre o Cinema e a Memória do Brasil de 1979, consta “a criação e a dinamização de centros regionais de cultura cinematográfica constituídos por unidades de produção e por filmotecas (arquivos de cópias de filmes), com a função básica de prospecção, pesquisa e divulgação do acervo brasileiro [… e] o estabelecimento de um inventário [nacional]” (1981, 67). Laura Bezerra relata a “criação de um programa de apoio às cinematecas que, apesar de não ter implementado ações sistemáticas e abrangentes, destinou recursos para algumas ações setoriais” (2014, 120). A descentralização é necessária, considerando a continentalidade e pluralidade cultural do país, além de tecnicamente ser desejada em caso de sinistros.
8. A CineOP é um evento criado em 2006 e tornou-se o principal fórum de discussões e articulações em torno do patrimônio audiovisual e o ensino do audiovisual no Brasil. A cada ano é redigido um documento pelos participantes do Encontro, a Carta de Ouro Preto, com alertas e proposições para o campo.
9. A ABPA é uma associação de profissionais, independentemente do vínculo com instituições, e tem atuado em prol de políticas para o setor, na projeção do patrimônio audiovisual e na realização de projetos, como a tradução e publicação de textos técnicos. A ABPA criou em 2016 o PNPA, documento de diagnóstico e proposições de ações e políticas para o campo da preservação audiovisual. http://www.abpreserva
caoaudiovisual.org
10. O papel principal do Conselho é atuar no desenvolvimento da Cinemateca. Seus membros são representantes dos poderes públicos da esfera federal, estadual e municipal, além de indivíduos da sociedade civil com atuação em cinema ou patrimônio. Curiosamente, nota-se uma predominância de homens dentre os conselheiros ao longo dos anos.
11. Atualmente é o Cinesala. Cinesala. Disponível em:
http://www.cinesala.com.br/cinesala. Acesso em: 4 ago. 2020.
12. O matadouro teve suas atividades encerradas em 1927. O terreno estava sendo utilizado como depósito de equipamentos de iluminação pública.
13. A partir de ideia de Gilberto Gil, músico e então membro do conselho de assessoramento cultural da BR Distribuidora, e posteriormente Ministro da Cultura, de 2003 a 2008.
14. Empresa estatal que impulsionou a produção, distribuição, exibição, preservação e restauração do audiovisual – vinculada à Petrobras, empresa brasileira de energia, gás e petróleo.
15. Em colaboração com a CB, o projeto também foi realizado na Cinemateca do MAM do Rio de Janeiro, inclusive o inventário do acervo, inédito na instituição e processamento de materiais deteriorados. A Cinemateca do MAM estava subjugada à direção do Museu, que determinou, de forma arbitrária, que não teria condições de manter o acervo audiovisual (insolitamente
após o inventário). Como resultado, parte do acervo foi alocada no Arquivo Nacional a partir de 2002 na mesma cidade, e parte foi recebida pela CB. Alguns detentores de materiais optaram por guardar consigo, muitas vezes em lugares inapropriados. Essa foi uma das maiores crises da instituição, de relevância histórica para o cinema brasileiro (sobretudo para o movimento do Cinema Novo) e para a preservação audiovisual, cuja direção passou por Cosme Alves Netto, com notória ligação com instituições internacionais. A partir de 1996, Hernani Heffner ingressa na instituição. Em 2020, passa por uma consolidação, com um novo prédio para o acervo documental e com mudanças estruturais na direção do Museu.
16. Segundo Souza, a Filmografia Brasileira foi iniciada por Caio Scheiby em fichas em papel e, nos anos 1980, foram publicados quatro cadernos com registros dos filmes produzidos até 1930 (2009, p.259). Atualmente, de acordo com o site da instituição, “contém informações de aproximadamente 42 mil títulos de todos os períodos da cinematografia nacional e da produção audiovisual mais ampla e recente, sejam curtas, médias ou longas-metragens; cinejornais; filmes publicitários, institucionais ou domésticos; e obras seriadas (para internet e televisão), com links para registros da base de dados de cartazes e referências de fontes utilizadas e consultadas”. Disponível em:
http://cinemateca.org.br/filmografia-brasileira. Acesso em: 13 ago. 2020.
17. Texto extraído da plenária realizada em 2008. Disponível em:
http://bases.cinemateca.gov.
br/page.php?id=90. Acesso em: 2 ago. 2020. Segundo Laura Bezerra, “o SiBIA foi pensado e executado a partir da CB/SAv sem quaisquer debates e negociações com os atores envolvidos, o que contradiz o espírito democrático-participativo defendido e praticado em documentos e ações do MinC” (2014, 185). O II Encontro Nacional do SiBIA ocorre em 2009, com 33 instituições de todo o país, e suas propostas, que demandavam recursos e ações da SAv, não se efetivaram. O projeto é extinto em 2009, sem desdobramentos práticos.
18. A Programadora Brasil foi um projeto de difusão de filmes (animação, experimental, ficção, documentário), que atuou de 2006 a 2013, por meio da edição de DVDs para circuito não comercial (cineclubes, centros culturais, escolas, universidades), em um total de 970 obras divididas em 295 DVDs.
19. Relatórios institucionais da Cinemateca Brasileira. Disponível em:
http://cinemateca.org.br/
institucional/relatorios-institucionais. Acesso em: 7 jul. 2020.
20. Esta unidade foi afetada pela enchente no início de 2020.
21. Revista da Cinemateca Brasileira. Disponível em:
http://cinemateca.org.br/
biblioteca/publicacoes-e-links. Acesso 7 jul. 2020.
22.
Acervos adquiridos pela União sob a guarda da Cinemateca: Estúdios Vera Cruz e Atlântida Cinematográfica (em 2009), Canal 100 e Glauber Rocha (em 2010), Goulart de Andrade e Dulce Damasceno de Brito (em 2011) e Norma Bengell (em 2012).
23. A paralisia afeta também o Centro Técnico do Audiovisual (CTAv), instituição no Rio de Janeiro, que correalizava diversos projetos da SAv com a CB.
24. Depósito Legal é o mecanismo de depósito de materiais comprobatórios da realização da obra audiovisual subvencionada com recursos federais, em instituições credenciadas pelo governo federal – até o momento, somente a CB. Após a aprovação do material (de acordo com diretrizes técnicas), a empresa produtora torna-se apta a receber a última parcela do investimento. Devido à redução do fluxo de análise na crise de 2013, foi gerado um passivo de materiais a serem analisados.
25. Olga Toshiko Futemma atua na Cinemateca Brasileira desde a década de 1980, com destaque para seu trabalho no Centro de Documentação e Pesquisa. Tornou-se diretora-executiva em 2004, diretora-adjunta de 2007 a 2013 e diretora de 2013 a 2018, quando se torna Gerente de Acervos. Participou do Comitê Executivo da Fiat a partir de 2009 até o ano de 2013.
26. Após o incêndio, foi mantida a mesma estrutura. De acordo com o Relatório da CB de 2016: “a edificação, desenhada nos anos de 1990, foi construída sem instalações elétricas ou hidráulicas, de modo a minimizar os riscos de acidente; sem climatização ativa, mas mantendo a temperatura interna com as menores variações possíveis e permitindo a circulação de ar, para evitar o acúmulo de gases resultantes da deterioração do suporte. Em caso de autocombustão […] inevitavelmente consumiria todo o conteúdo da câmara, mas não se espalharia para as outras adjacentes” – que foi o que ocorreu em 2016, o fogo consumiu apenas uma das quatro câmaras.
27. Como exemplo, o ARRISCAN, quando adquirido, foi adaptado para materiais deteriorados, o que permitiu o escaneamento de negativo com 4% de encolhimento, medida que seria considerada inviável para outros laboratórios.
28. Bases de dados do Centro de Documentação e Pesquisa. Disponível em:
http://bases.cinemateca.org.br. Acesso em: 7 ago. 2020.
29. O setor de difusão seguiu praticando a premissa de exibição de filmes do acervo, respeitando seu suporte original, privilegiando o cinema brasileiro; e realizando mostras, com materiais do acervo ou de parceiros, ou recebendo festivais nas duas salas de cinema e na tela externa da Cinemateca – projeções em 16mm, 35mm e digital, e alguns formatos em vídeo analógico.
30. Ainda de acordo com o relatório, “o processo de duplicação emergencial difere da restauração de filmes, conceito este aplicado quando são confeccionadas novas matrizes de preservação, de imagem e som, e cópias de acesso, incluindo diferentes graus de manipulação para minimizar marcas do uso ou deterioração, buscando a forma como a obra foi difundida em seu lançamento original. Uma restauração usualmente reúne e compara diversos materiais para seleção dos melhores, enquanto a duplicação emergencial trata de uma copiagem de um suporte em deterioração avançada, geralmente único, para um outro, novo.”
31. Carlos Roberto de Souza destaca que “os trabalhos de pesquisa e historiográficos brasileiros realizados […] chamaram a atenção para o fato de que é um equívoco construir uma história do cinema brasileiro a partir do filme de ficção de longa metragem. A produção brasileira de maior volume foi sempre a de documentários e cinejornais, geralmente relegada a segundo plano pelos chamados historiadores clássicos, pela mídia e pelo público em geral. A realidade da produção reflete-se no acervo cinematográfico que chegou até nossos dias. O percentual de filmes de não-ficção ultrapassa avassaladoramente o de longas de ficção e continua o menos preservado. Isso não significa que todos os longas de ficção estejam preservados. Longe disso. A parcela mais tratada – nem sempre com os cuidados que merece – é a dos longas brasileiros consagrados.” (2009, p.261).
32. Posteriormente descobriu-se que há um campo homônimo na base Filmografia Brasileira, conduzida pelo Centro de Documentação e Pesquisa, que constava dentre os campos excluídos do fluxo à época. Tratava-se de um sistema numérico de 0 a 5. Considerando que os técnicos da Preservação que propuseram a metodologia não tinham experiência anterior na instituição, a proposição não seguiu o sistema numérico, mas categorias de texto. Como exemplo, as categorias ‘preservado no momento’ (considerando matrizes originais, intermediários e cópias de acesso em bom estado, por exemplo), ‘parcialmente preservado’, ‘não preservado’, ‘parcialmente perdido’, com a inclusão de adendos como ‘com defeitos’ (interferências na imagem ou som), ‘incompleto’, etc. O sistema permitiu agilidade nos fluxos de seleção de materiais para duplicação emergencial e pesquisa para acesso externo.
33. Ferramenta proposta pela Unesco em 1988, por seu caráter moldável, que se assemelha a cartões físicos de biblioteca individuais, com limitado cruzamento de informações.
34. A ferramenta foi inicialmente pesquisada e selecionada pelas equipes do laboratório e de desenvolvimento anteriormente a 2016. Foi adotado pela equipe da preservação em 2016, perfil mais institucional em 2017 – trac.cb – em seguida pela equipe do Centro de Documentação e Pesquisa e, por último, e com uso comedido, pela equipe da difusão.
35. Precisamosfalar sobre... o logo da Cinemateca Brasileira. Disponívelem:
https://twitter.com/cinematecabr
/status/798954169386336256. Acesso em: 14 jul. 2020. A logomarca é identificada pormuitos por sua forma fálica, o que poderia ter contribuído para o grau deviralização e atenção à Cinemateca em 2016.
36. Manifesto pela Cinemateca Brasileira - 2016. Disponível em: https://manifestopela
cinematecabrasileira
.wordpress.com. Acesso em: 20 jul. 2020.
37. 100 Paulo Emílio. Disponível em:
http://cinemateca.gov.br/
100pauloemilio. Acesso em: 20 jul. 2020.
38. Questiona-se a legalidade da realização de um aditivo ao contrato principal. De qualquer forma, consideramos um ultraje que a gestão da Cinemateca Brasileira seja regida por um aditivo como instrumento legal.
39. Como ocorreu em casos de acesso aos originais para digitalização e licenciamento ao Canal Brasil, principal canal de televisão de obras brasileiras, que estava atualizando seu catálogo, anteriormente em resolução SD. A entrega ao Canal seria em HD ou superior, apesar de ser uma resolução datada. Os produtores optavam por resolução HD e não em 2K, por limitação de orçamento, mas além de ser mais relevante comercialmente a médio prazo, o 2K representa uma ação mais significativa de preservação, uma vez que seria um resguardo por mais tempo do material original em película – grande parte já em más condições.
40. Sobretudo a
pejotização: a contratação de serviços de indivíduos por meio de empresas constituídas para tal.
41. Essa dinâmica de dispersão de força de trabalho é ainda mais perigosa no contexto da preservação digital, que demanda uma constante atualização de saberes devido, à incessante mudança da tecnologia e de práticas de mercado.
42. E-mail de 29 de junho de 2016. Disponível em:
https://groups.google.com/g/lista-da-abpa. Acesso em: 15 jul. 2020. Débora Butruce indica que o tema de gestão por OS foi debatido em um Grupo de Trabalho ao longo de alguns anos: 15ª CineOP. Instituições de patrimônio em risco: Caso Cinemateca Brasileira. Disponível em:
https://cineop.com.br/debate/
instituicoes-de-patrimonio-em-risco-caso-cinemateca-brasileira /
https://www.youtube.com/watch?v=zFmtVJxLl54. Acesso em: 14 ago. 2020. Além de Butruce, participaram do debate Carlos Augusto Calil, Fabiana Ferreira e Eloá Chouzal, na mediação.
43. Jorge Barcellos resume da seguinte maneira: “[…] ao longo do tempo as OS tornam-se deficitárias e custosas”; e alerta que “segundo Alzira Angeli, da Controladoria Geral da União, estas organizações transformaram-se no novo nicho de mercado da corrupção e [segundo o historiador Francisco Marshall] “a iniciativa promove a degradação da gestão pública”. Disponível em:
https://jorgebarcellos.pro.br. Acesso em: 20 ago. 2020. Como exceção, alguns museus no Estado de São Paulo seguem com êxito no modelo de gestão por OS.
44. Em contraste com o modelo estadunidense, no qual famílias bilionárias e grandes corporações subvencionam projetos e instituições de cultura e patrimônio, por fundações.
45. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com diversos benefícios ao trabalhador, como férias remuneradas, 13° salário, seguro-desemprego, auxílio-doença, salário-família, salário-maternidade e aposentadoria.
46. A prospecção de materiais é uma função primordial da CB, por ser a principal instituição nacional e considerando o secular histórico de destruição e descaso com o patrimônio audiovisual brasileiro. Tornaram-se notórias notícias de acervos potencialmente valiosos nos últimos anos, e não foi possível a atuação de técnicos da CB. Por intermédio da Acerp, foi feita avaliação em um acervo no interior de São Paulo. O corpo técnico assumiu o contato com o Ministério das Relações Exteriores para a avaliação da listagem de acervos de cópias 35mm em Embaixadas do Brasil em Roma, Berlim e Haia para a repatriação. Acerp posteriormente assumiu o diálogo e não conseguiu efetivar o translado.
47. A Missão Institucional estava sendo consolidada em um documento, que não se efetivou na gestão da Acerp.
48. Fórum de discussão de liberdade, autonomia, segurança na Internet. CryptoRave. Disponível em:
https://cryptorave.org. Acesso em: 15 ago. 2020.
49. A distância entre as duas cidades é de mais de 400 km, cerca de 1 hora de voo.
50. Militares fardados ocasionalmente visitavam a instituição. Um episódio tornou-se notório: a visita de um deputado, com mesmo sobrenome que seu tio-avô, o primeiro presidente da ditadura militar. Ele publicou um vídeo em redes sociais, dentro da CB e acompanhado por representantes da instituição, anunciando a mostra de filmes militares, reproduzindo o slogan de campanha do presidente e batendo continência. A série não foi realizada.
51. O que possibilitou uma efetiva resposta aos danos ao estúdio e ao acervo do fotógrafo Bob Wofelson, localizado nas mediações do galpão da Cinemateca, que contou com um número grande de voluntários sob coordenação da equipe técnica do Instituto Moreira Salles (IMS). Uma técnica da Cinemateca Brasileira estava entre as voluntárias (fora do horário de trabalho da CB). Essa foi a 2ª enchente que afetou o estúdio do fotógrafo. As enchentes na região são recorrentes, de maneira que esse relato é a crônica de uma tragédia anunciada.
52. O trabalho consistia em movimentar sacos com pilhas de latas de filmes cheias de água suja, abrir cada lata para verificar o estado do material, determinar destino ao material e organizar o acervo nas estantes. Em um primeiro momento, as equipes de limpeza e manutenção executaram uma força tarefa junto à equipe técnica para escoar a água, limpar estantes e ajudar na movimentação de sacos de filmes, porém antes que esse trabalho chegasse ao fim, essas equipes foram drasticamente reduzidas.
53. A primeira delas, referente à nomeação como diretora de uma atriz que desempenhava há dois meses o papel de Secretária Especial de Cultura em Brasília e queria retornar a São Paulo por questões pessoais. No entanto, não havia nenhum cargo legalmente disponível para ela assumir na CB naquela época e ela acabou não trabalhando na instituição.
54.
Cinemateca Brasileira pede socorro. Acesso em: 9 set. 2020. Nesta data, o manifesto teve mais de 28,5 mil adesões.
55. Cinemateca Viva, grupo formado por Associação dos Moradores da Vila Mariana <
http://www.cinematecaviva.com.br>; o grupo Cinemateca Acesa <
https://www.facebook.com/
CinematecaAcesa>; S.O.S. Cinemateca Brasileira
https://www.instagram.com/
soscinematecabrasileira; e Cinemateca em Crise, criado em 2013, com atualizações com a crise de 2020 <
https://www.facebook.com/
cinematecaemcrise>. A Apaci desde 2015 esteve ativa e em contato com a diretoria da CB, para garantia da execução dos trabalhos da instituição.
56. Trabalhadores da Cinemateca Brasileira. Disponível em:
https://twitter.com/trabalhadorescb. Acesso em: 18 ago. 2020.
57. Cinemateca Brasileira - Trabalhadores em Emergência. Disponível em:
https://benfeitoria.com/
trabalhadoresdacinemateca. Acesso em: 30 ago. 2020.
58.
A crise na cinemateca brasileira - Soluções Urgentes. Disponível em:
https://edemocracia.camara
.leg.br/audiencias/sala/1595. Acesso em: 30 ago. 2020. Gabriela Queiroz, coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa desde 2014 até 2020, representou a instituição.
59. Como exemplo, as afirmações de que “todo” o patrimônio audiovisual brasileiro está na CB, de que a instituição poderia pegar fogo se a luz fosse cortada (os depósitos de nitrato não possuem sistema elétrico); e a utilização do termo ‘laboratórios climatizados’ para designar ‘depósitos climatizados’.
60. A entrega de chaves foi marcada pela presença de agentes ostensivamente armados da Polícia Federal, que foram convocados com o pressuposto de que poderia haver resistência na entrega das chaves pela Acerp. As chaves foram entregues, os documentos foram assinados e foi realizada uma visita técnica. Mesmo que utilizada de forma coadjuvante, foi a primeira vez que intimidação policial ocorreu na instituição. A Acerp tentou obter ressarcimento dos valores investidos na CB em 2019 e 2020, alegadamente no total de R$ 14 milhões.
61. Carta de Gramado 2020. Disponível em:
http://www.festivaldegramado
.net/festival-lanca-a-carta-de-gramado. Acesso em: 30 set. 2020.
62. Generalizações são arriscadas e podem ser equivocadas. Afinal, temos muitos produtores que entendem, enaltecem e investem em preservação, sobretudo depois da crise de 2020. Se essas palavras não fazem justiça à atuação de produtores em prol do patrimônio audiovisual, ficarei feliz em publicar meu equívoco. Mas esse texto foi fermentado pela frustração de ver a soberba da cadeia audiovisual, com suas festas, mercados,
deals,
marketshare,
box office,
hold back,
catch up,
pitch,
players e recursos caudalosos, enquanto a menção a investimentos em preservação gerava tremores! Essa postura gananciosa da cadeia produtiva é um descaso em relação ao patrimônio audiovisual brasileiro e aos profissionais da área.
63. Fontes: sites do FSA e da Cinemateca Brasileira. Originalmente publicado em MENEZES, Ines Aisengart. O profissional atuante na preservação audiovisual. Museologia & Interdisciplinaridade. Vol. 8, nº15, Jan./ Jul. de 2019. Nota do original com correção: A Cinemateca Brasileira é a única instituição que recebe materiais em Depósito Legal e conforme Laura Bezerra (2015), seu orçamento representa quase que a totalidade de investimentos em preservação audiovisual, no período, no país. Desta forma, considero o gráfico uma ilustração direta do desnível de investimentos em produção e preservação audiovisual”. O gráfico alcança somente até 2017, pois a partir de então a Cinemateca Brasileira não publicou mais relatórios institucionais. Em 2019, no novo governo, foram interrompidos os repasses do FSA.
64. Documento SEI / ANCINE - 0413350 - Resolução CGFSA Nº 101 - Aprovação do Plano Anual de Investimentos FSA 2017. Disponível em:
https://fsa.ancine.gov.br/sites/
default/files/resolucoes-cgfsa/RESOLUÇÃO CGFSA Nº 101 - aprova PAI FSA 2017.pdf. Acesso em: 3 out. 2020.
65. Por meio de mecanismo não reembolsável, que não prevê o retorno em lucro financeiro, mas com outros desenhos de contrapartida.
66. Documento SEI / ANCINE - 0845324 - RESOLUÇÃO CGFSA Nº 155 - Aprovação do Plano Anual de Investimentos de 2018. Disponível em:
https://fsa.ancine.gov.br/sites/
default/files/resolucoes-cgfsa/RESOLUÇÃO CGFSA Nº 155 - Plano Anual de Investimentos 2018.pdf. Acesso em: 3 out. 2020.
67. Recursos disponibilizados para Ações e Programas - 2008 a 2018. Disponível em:
https://fsa.ancine.gov.br/resulta
dos/investimentos/valores-investidos. Acesso em: 3 out. 2020. Valor completo informado nesta data de R$ 4.558.877.384,00.
68. De acordo com Gomes (2020), a maioria dos materiais recebidos em Depósito Legal está em HD externos, que necessitam verificação contínua – “materiais digitais, portanto, requerem checagens e migrações mais constantes, uma necessidade que a Cinemateca Brasileira ainda não pode atender, tanto por limitações do número de funcionários, quanto financeiras”. Parte da numerosa coleção em vídeo magnético da instituição é oriunda de Depósito Legal. De um modo geral, no período de 2016 a 2020, não foram realizadas ações de preservação das coleções em vídeo e digital, somente duplicação para acesso. Considerando a inação, de uma forma ampla e sistemática, em relação ao escopo do patrimônio concebido em digital, pode-se esperar uma superação das (notoriamente altas) taxas de perda em relação ao patrimônio em película – sobretudo em relação às primeiras produções criadas em digital.
69. ICAB e NETFLIX fazem parceria para criar FUNDO EMERGENCIAL de apoio a comunidade criativa brasileira. Disponível em:
http://icabrasil.org/2016/index.
php/mediateca-reader/icab-e-netflix-fazem-parceria-para-criar-fundo-emergencial-de-apoio-a-comunidade-criativa-brasileira.html. Acesso em: 27 set. 2020.
70. Netflix, Streaming Video and the Slow Death of the Classic Film. Disponível em:
https://www-newsweek-com.cdn.ampproject.org/c/s/www
.newsweek.com/2017/09/22/netflix-streaming-movies-classics-664512.html. Acesso em: 27 set. 2020. Supreme Court Urged to Make Old Movies Digitally Available. Disponível em:
https://www.hollywoodreporter
.com/thr-esq/supreme-court-urged-make-old-movies-digitally-available-1218088. Acesso em: 27 set. 2020. O repertório de filmes antigos é um nicho explorado por plataformas como The Criterion Channel e Mubi, entre outros.
71. Um aspecto sensível para a comercialização de obras antigas é a normatização, para emissão do Certificado de Produto Brasileira (CPB) e a documentação dos direitos, para viabilizar o licenciamento. Historicamente, muitos filmes foram realizados sem a devida documentação e muitas empresas se dissolveram sem a documentação de repasse dos direitos.
72. No contexto brasileiro, onde a primeira atividade como
profissional é explicar qual a sua
função como profissional, os documentários da Netflix com imagens de arquivo costurando sua narrativa costumam ser uma explicação para leigos sobre a importância da preservação do patrimônio.
73. Relatório de 2016: páginas 55 e 56. Correção ao conteúdo:
Bacalhau (1976, Adriano Stuart) é colorido, não p&b.
74. Aqui vale uma reflexão sobre a excelência catalográfica e a boa navegabilidade do projeto, mas a necessidade de revisão de especificidades técnicas e das dimensões do logo ocupando parte da imagem, experiência reportada como frustrante para muitos.
75. Filmes brasileiros considerados perdidos ou prestes a sê-lo. Disponível em:
http://www.contracampo.com.
br/34/filmesperdidos.htm. Acesso em: 21 ago. 2020.
76. Como tecnologias proprietárias; obsolescência de formato de arquivo, codec, software, hardware; gerenciamento de metadados; migração, entre outros.
77. Além de catastrófico ambientalmente para a fauna e a flora, a devastação vai afetar diretamente o campo de preservação de patrimônio cultural, pela relação direta com o clima, como a variação maior de temperatura e umidade, por exemplo. Desconheço estudos no Brasil sobre a crise climática e a área de patrimônio. Mundo afora, destaco o Orphans 2020, em torno do qual ocorreram diversos debates.
78. Supercomputador de inteligência artificial da série da
Westworld (2016, Jonathan Nolan), ambientada em quase quatro décadas no futuro.
79. Cujo símbolo é a ciência sendo desacreditada pelas redes sociais e meios de comunicação de mensagens (sobretudo WhatsApp, empresa adquirida pelo Facebook), tornando difícil a difusão de informações cientificamente fundamentadas, com olhar crítico na contenção da pandemia de Covid-19. Uma pesquisa realizada em vinte países mostra que brasileiros são os que menos acreditam em seus cientistas: Brasil de costas para a ciência. Disponível em:
https://piaui.folha.uol.com.br/brasil-de-costas-para-ciencia. Acesso em 30 set. 2020.
80. Filmografia Ditadura Brasil. Disponível em:
http://historiaeaudiovisual.
weebly.com/filmografia-ditadura-brasil.html. Acesso em: 2 set. 2020.
BIBLIOGRAFIA
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FERREIRA, Fabiana Maria de Oliveira. A Cinemateca Brasileira e as políticas públicas para a preservação de acervos audiovisuais no Brasil. Universidade de Brasília, 2020.
GOMES, Paulo Emílio Sales. Crítica de Cinema no Suplemento Literário - Volume I. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982.
GOMES, Paulo Emílio Sales. Crítica de Cinema no Suplemento Literário - Volume II. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982.
SOUZA, Carlos Roberto de. A Cinemateca Brasileira e a preservação de filmes no Brasil. São Paulo, 2009.