A Cinelimite, o Núcleo de Documentação Cinematográfica da UFPB (NUDOC) e a Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA) apresentam, em comemoração ao mês do orgulho gay, A Onda de Filmes Queer em Super-8 da Paraíba.
No final da década de 1970 e início da década de 1980, durante a ditadura militar brasileira, um grupo de cineastas queer do estado da Paraíba fazia cursos de "Cinema Direto" (também chamado de Cinéma Vérité) no NUDOC (Núcleo de Documentação Cinematográfica da Universidade Federal da Paraíba), uma oficina de documentário criada pelo grande cineasta francês Jean Rouch, por meio de sua escola de cinema Ateliers Varan. A oficina de Cinema Direto equipou o NUDOC com filmes, câmeras Super-8, equipamentos de iluminação, tripés e muito mais. Isso teve um grande impacto no cenário cultural de João Pessoa, pois, pela primeira vez, a produção de filmes era algo possível para um grupo mais amplo.
Alguns desses cineastas queer tiveram a oportunidade de estudar Cinema Direto na França, na escola de cinema Ateliers Varan, como parte de um programa de intercâmbio com o NUDOC. Outros, que não estavam tão envolvidos com os cursos do NUDOC, se opunham aos princípios formalistas do Cinema Direto de Rouch e, em vez disso, se sentiam inspirados pelo que tinham visto no filme Gadanho (1979), o estudo social inovador de João de Lima Gomes e Pedro Nunes, filmado em Super-8, que provou a uma geração de cineastas que era possível produzir filmes na Paraíba com esse formato de pequena escala recentemente disponibilizado.
Inspirados pelo que aprenderam e pelas novas possibilidades da produção independente de filmes, esses artistas e amigos formaram um grupo de ativistas gays e começaram a colaborar em filmes Super-8 que usavam técnicas experimentais de documentário para abordar temas queer na Paraíba. A Onda do Cinema Queer em Super-8 da Paraíba apresenta cinco dessas obras fascinantes e há muito esquecidas do que é possivelmente o único movimento cinematográfico queer do século XX no Brasil.
Closes (1982), de Pedro Nunes, apresenta depoimentos de brasileiros que discutem os direitos dos homossexuais, intercalados com uma história romântica de amor gay que culmina em sexo em uma praia. Baltazar da Lomba (1982), do coletivo ativista queer Nós Também, reencena de forma autorreflexiva a história do primeiro homem condenado por sodomia no Brasil colonial, enquanto Era Vermelho Seu Batom (1983), de Henrique Magalhães, examina os estereótipos e a discriminação dentro da comunidade gay e as tensões entre homens que vivem no armário e homens que saem dele. Miserere Nobis (1983), de Lauro Nascimento, apresenta uma encenação homoerótica queer de A Última Ceia, enquanto Perequeté (1981), de Bertrand Lira, é um retrato mais direto do ator e dançarino Francisco Marto. Realizados durante a ditadura civil-militar brasileira, esses filmes foram exibidos em ambientes públicos sujeitos à repressão do regime autoritário. Eles continuam polêmicos até hoje.
Esse programa apresenta novas cópias em 2K digitalizadas durante o projeto Digitalização Viajante, que ocorreu entre outubro de 2022 e fevereiro de 2023 em seis cidades brasileiras (Brasília, Recife, João Pessoa, Teresina, Rio de Janeiro e São Paulo). A Digitalização Viajante é um projeto criado pela Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA) e pela Iniciativa de Digitalização de Filmes Brasileiros (IDFB). Este programa apresenta também quatro novas entrevistas aprofundadas com os diretores Pedro Nunes, Henrique Magalhães e Bertrand Lira, além de uma entrevista com Francisco Marto, personagem principal do filme Perequeté.
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Disponível gratuitamente entre 1º e 30 de junho
Texto escrito por Adam Baran (Narrow Rooms) com pequenos acréscimos para esta mostra online.
Agradecimentos especiais: Pedro Nunes, Henrique Magalhães, Bertrand Lira, Erik Clementino, Adam Baran, Fernando Trevas, João de Lima Gomes, Maviael Ribeiro, Francisco Marto, Júnior Pinheiro, Amanda Lima e Hélder Nóbrega
Cinelimite, the Núcleo de Documentação Cinematográfica of UFPB (NUDOC), and the Brazilian Audiovisual Preservation Association (ABPA) present, in celebration of gay pride month, The Wave of Queer Cinema in Super-8 from Paraíba.
In the late 1970s and early 1980s, during Brazil’s military dictatorship, a group of queer filmmakers in the northeastern state of Paraíba were taking courses in “Direct Cinema” (also called Cinéma Vérité) at NUDOC (The Federal University of Paraíba’s Cinematographic Documentation Center), a documentary film workshop created by the great French filmmaker Jean Rouch, through his Ateliers Varan film school. The Direct Cinema workshop equipped NUDOC with film, Super-8 cameras, lighting equipment, tripods, and more. This had a major impact on the cultural scene of João Pessoa, as, for the first time, filmmaking was something possible for more people.
Some of these queer filmmakers had the opportunity to study Direct Cinema in France at Ateliers Varan film school, as part of an exchange program with NUDOC. Others, who were not as involved with the NUDOC courses, felt opposed to the formalist principles of Rouch’s Direct Cinema, and instead felt inspired by what they had seen in the film Gadanho (1979), João de Lima Gomes and Pedro Nunes’ groundbreaking social study, shot on Super-8, that proved to a generation of filmmakers that it was possible to produce serious films in Paraíba with this newly available small-gauge format.
Inspired by what they learned, and the new possibilities of independent film production, these artists and friends formed a gay activist group and began collaborating on Super-8 films that used experimental documentary techniques to address queer issues in Paraíba. The Wave of Queer Cinema in Super-8 from Paraíba presents five of these fascinating and long-overlooked works from what is likely the only 20th-century queer film movement in Brazil.
Closes (1982), by Pedro Nunes, features interviews with Brazilians discussing gay rights, interspersed with a romantic story of gay love that culminates in sex on a beach. Baltazar da Lomba (1982), by queer activist collective Nós Também, self-reflexively re-enacts the story of the first man convicted of sodomy in colonial Brazil, while Era Vermelho Seu Batom (1983), by Henrique Magalhães, examines stereotypes and discrimination within the gay community and the tensions between closeted and out men. Miserere Nobis (1983), by Lauro Nascimento, presents a homoerotic queer staging of The Last Supper, while Perequeté (1981), by Bertrand Lira, is a more direct portrait of actor and dancer Francisco Marto. Made during the military dictatorship, these films were shown in public environments subject to the repression of the authoritarian regime. They remain controversial to this day.
This program features new 2K copies, digitized during the project Traveling Digitization, which took place between October 2022 and February 2023 in six Brazilian cities (Brasília, Recife, João Pessoa, Teresina, Rio de Janeiro and São Paulo). The Traveling Digitization is a project created by the Brazilian Audiovisual Preservation Association (ABPA) and the Brazilian Film Digitization Initiative (IDFB). This program also features 4 new in-depth interviews with directors Pedro Nunes, Henrique Magalhães, and Bertrand Lira, in addition to an interview with Francisco Marto, the leading figure in the film Perequeté.
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Available for free between June 1st and June 30th.
Text written by Adam Baran (Narrow Rooms) with small additions for this online mostra.
Special thanks: Pedro Nunes, Henrique Magalhães, Bertrand Lira, Erik Clementino, Adam Baran, Fernando Trevas, João de Lima Gomes, Maviael Ribeiro, Francisco Marto, Júnior Pinheiro, Amanda Lima, and Hélder Nóbrega
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